Era tudo cinza, na tarde de ontem.
Friamente, cinza.
Em preto e branco eu adormeci.
Em preto e branco amanheci.
É tudo cinza hoje.
Friamente, cinza.

Vá solidão...

Quero dizer o quanto questiono tua existência, solidão.
Sozinho, vejo as paredes me acolherem.
Sinto o aconchego dos braços do meu sofá.
O cafuné do meu travesseiro é confortante.
Sigilo meus temores dentre lençóis, pelúcias e sono.
Encontro-te de passagem, solidão.
Sou forte o bastante pra não ser tão só de querer tua companhia.
E fraca para tê-la.
Teu encontro me revela que nem existes!
Como sozinho se tenho a ti?
És desagradavelmente presente.
Quando um grande amor se vai, aqui estás.
Quando os amigos voltam pra casa, aqui estás.
Quando o telefone já nem toca, estás.
E, ainda que eu tenha tudo isso, não hesitas em me visitar.
Devo questionar se me adoras?
Apesar de tua fidelidade quero que vá.
Mas volte para me dizer como estás sem mim.
Não quero que sintas o que sinto agora, solidão.
Posso consolar-te, assim como o fez.
Mas preciso que vá.
Tenho que ir lá fora.
Sentir.
Ouvir.
Volte, solidão...
Talvez encontres a porta aberta.
Não use a tua chave, pois trocarei a fechadura.
Só me permitirei certas visitas.
Mas volte...
Volte pra mim com o mesmo desejo que te mando embora.
Nunca tive alguém que me quisesse tão bem.
Vá.
E se alguém ousar questionar tua existência direi que foste minha por inteira.